quarta-feira, 17 de junho de 2015

Aquela semana em que o "Leão" Gilberto Barros detonou Yu-Gi-Oh!

O Leão também chegou a humilhar Goku em rede nacional (Foto: Divulgação)

Nesta segunda (15) a Netflix estreou as duas primeiras temporadas do anime Yu-Gi-Oh! em seu catálogo. A série pode ser vista também na grade do canal pago PlayTV. Pra quem tem menos de 18 anos, mencionar o título pode ser fácil como qualquer outro anime popular. Mas pra quem era criança/adolescente no auge do seu sucesso na Globo e na Nickeloedeon, no ínicio da década passada, é praticamente impossível não lembrar da polêmica que caiu pra cima de Yugi Muto/Yami Yugi em plena rede nacional.

E o antagonista deste capítulo sombrio da história dos animes no Brasil foi nada mais e nada menos que o "Leão" Gilberto Barros. A confusão toda se deu em quatro noites seguidas da primeira semana de junho de 2003, durante o tempo em que comandava a segunda fase do extinto programa Boa Noite Brasil (a primeira foi comandada pelo saudoso e lendário Flávio Cavalcanti entre 1982 e 1983).

Nas três primeiras noites, Gilberto dedicou a primeira meia hora do diário para fazer uma "denúncia" contra o card game daquele momento. Ele mesmo denominava de "o baralho do demônio" de uma forma sensacionalista e assustadora. E sem contar que o mesmo chegava a generalizar e tentar associar com outro card game famoso entre jovens e adultos, o Magic (também lançado por aqui pela Devir). Lembro que numa dessas noites um determinado político mineiro chegou a acusar os jogos como parte das máfias japonesa (Yakuza?!), americana e russa. Nunca houve quem provasse esse tipo de afirmação absurda e jamais haverá.

Claro que teve toda uma comoção na internet entre os fãs de Yu-Gi-Oh! e com toda a razão. Afinal, sintonizar a tevê às dez da noite e se deparar com um conhecido apresentador detonar um anime famoso - sem ao menos conhecer do que realmente se trata - era trágico. Sites como a Herói (ainda lá na primeira versão) rebateram a acusação de Gilberto Barros e a ira dos fãs era visível no mural de comentários que os leitores deixavam nas páginas de notícias (a seção Papum) e de crítica, que perdurou debates por todo o resto daquele ano. O jornalista Odair Braz Jr. (atualmente do Portal R7) frisou bem um termo que poderia muito bem resumir toda aquela repercussão em apenas duas palavras: polêmica falsa.

Mas foi na noite da quinta-feira, 5 de junho de 2003, que o Boa Noite Brasil se dedicou inteiramente a tratar sobre o tal "baralho do demônio". Gilberto, como já estava fazendo, não media esforços pra satanizar Yu-Gi-Oh! (o tal baralho que acusou sem ao menos saber o que é de fato). Mas deixou espaço para ambas as partes. Ou melhor, três lados.

Para a acusação havia um teólogo que dizia coisas como "não entregue os seus filhos nas mãos do demônio" e tentou hostilizar todo tipo de jogos de card game e até RPG, como se a temática sobre demônios, vampiros, lobisomens e coisas do gênero fossem uma pura apologia ao satanismo. Coisa que até hoje ninguém jamais conseguiu comprovar de fato. Para a defesa estava um organizador de eventos especializados em card game, Luciano Santos, que explicou a origem e a essência de Yu-Gi-Oh e que ali se tratava apenas de um jogo que exercitava agilidade e inteligência. No mais, nada de influências sobrenaturais que transformassem as crianças em zumbis como os leigos queriam subtender naquele tempo. Luciano chegou a ressaltar que haviam card games e RPGs voltados para o público cristão, principalmente para os pequeninos. O terceiro lado era neutro e que procuraram entender os jogos sem julgamento. Ali estavam um psicólogo e um juiz da vara da infância e juventude.

Mas como se não bastasse todo o esclarecimento, o Leão tinha uma estranha "carta" na manga e bem pior que um deck com várias cartas de ressurreição. Ele mostrou um trecho de uma cena do filme A Árvore do Poder, do anime Dragon Ball Z (lançado nos cinemas brasileiros como Dragon Ball Z - O Filme) onde o saiyajin Tales (Turles no original) usou Gohan, o filho de Goku, para que ele se transformasse no temível macaco gigante Ozaru. Na cena em que Gohan transformado atacava (inconscientemente) seu pai, Tales disse algo como: "E o filho esmagará o pai como uma barata tonta". Gilberto usou esta cena pra tentar "provar" um inexistente ponto onde haveria uma "influência negativa" e de "imposição de filho contra pai". O que por si é uma acusação inverídica. Ora, a produção do programa era de uma emissora que já tinha exibido a série Dragon Ball Z às tardes poucos anos antes do tal evento. Mais estranho do que essa contradição (permitida pela própria Band) foi a omissão do Leão quanto à citação do final do filme onde o bem vence o mal e Goku e Gohan superam a luta como pai e filho. Ironicamente, outros dois animes chegaram a anteceder o Boa Noite Brasil meses depois 9ainda em 2003). Slayers (primeira temporada) e Batalha dos Planetas (primeira adaptação americana do Gatchaman). Bem, depois de tanta polêmica, Gilberto deu chance pra Yu-Gi-Oh! e disse que jogaria com o seu filho a partir de então. Né, Leão?

Com certeza esta foi uma época tensa que poderia ser esquecida. Melhor dizendo, tamanho vexame tem mais é que ser lembrado para mostrar que não adianta um ou outro leigo querer tentar provar com a "visão de chifre em barriga de bode" e querer dominar um assunto que não se entende. Aliás, Yu-Gi-Oh! é um anime baseado no mangá de Kazuki Takahashi, publicado na Weekly Shonem Jump (da editora Shueisha). É preciso que se diga que Yu-Gi-Oh!, assim como os demais títulos publicados (como Os Cavaleiros do Zodíaco, Dragon Ball, One Piece, Hunter x Hunter, YuYu Hakusho, etc), são formados por três pilares essenciais: amizade, persistência e vitória. E logicamente nenhum desocupado da oposição irá afirmar isso para um pai de família. É nessas horas que a palavra dos fãs é essencial e deve ser levada a sério.

Yu-Gi-Oh! atualmente em dose dupla no Brasil

4 comentários:

  1. lembrei disso hoje, na epoca eu nao cheguei a ver a tal reportagem, mas minha vó quis me proibir de jogar yugioh por causa disso, entao resolvi procurar algo na internet agora que lembrei, e por acaso caí no seu post, bem recente... na epoca eu era novo, e lembro de muitas coisas assim, por exemplo um dia na minha escola que um rapaz foi chamado pra dar uma palestra sobre games, eu que na época amava games, e estava por dentro de tudo saí de la revoltado com quanta baboseira ele disse, hoje eu vejo que ele era provavelmente um evangélico fanatico, eu lembro dele dizer que mu era do demonio (só porque tem demonios), falar bastante sobre gta (até que ele tinha um pouco de razão), call of duty, jogos de tiro, e o que mais me deixou puto foi uma historinha que ele contou sobre ragnarok: ele disse que seu filho o pediu permissao para jogar ragnarok (disse q o filho sempre pedia permissao pra evitar jogos do mal), e na hora que ele viu aquele jogo com personagens bonitinhos etc ele deixou pq achou que nao teria nada de mais, mas que depois foi pesquisar e descobriu que a historia do jogo era basicamente um filho que queria matar o pai pra poder ficar com a mãe, completamente absurdo. hoje em dia eu fico pensando quantos garotos deixaram de se divertir por gente imbecil como esses, queria saber que curriculo um cara desse tinha pra ir dar palestra numa escola, fazer os alunos perderem aula pra falar tanta asneira... naquela epoca poucos sabiam usar a internet, os que sabiam mais pra falar a verdade eram os garotos que jogavam jogos on line, um cara desse provavelmente pesquisava no google, ou então perguntava num fórum de games sobre o que se tratavam os jogos e os usuarios respondiam zoando, e ele tinha aquelas respostas como verdade absoluta... exemplo:

    ele: galera alguem conhece um jogo chamado ragnarok, meu filho pediu pra jogar

    respostas: 1 - é do demonio, nao deixa
    2 - é um jogo que o filho mata o pai pra comer a mae
    e muitas outras besteiras

    inclusive esse tipo de palestra era muito comum, acho que pelo menos uma vez por mes minha mae dizia que teve uma, ou que uma amiga disse pra ela nao sei o que sobre algum jogo, felizmente nunca fomos religiosos, entao era só eu explicar pra ela e continuar jogando

    enfim, ainda bem que evoluímos muito, e hoje qualquer um sabe entrar no google e fazer uma pesquisa, avaliar fontes, etc, e provavelmente coisas como essa nao acontecem mais

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  2. Amigo, você tem o vídeo desse programa? Já tem um bom tempo que estou à procura.

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    1. Infelizmente não, Edmar. Também queria rever isso. Relembrei de cabeça mesmo.

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